segunda-feira, 16 de junho de 2014

Relatório do grupo de trabalho sobre Educação Especial

2014-06-11 às 19:44

APRESENTADO RELATÓRIO SOBRE EDUCAÇÃO ESPECIAL

O Grupo de Trabalho nomeado pelo Governo para estudar a revisão da legislação que regula a Educação Especial apresentou as suas conclusões e recomendações, depois de auscultadas mais de 50 instituições e entidades, entre as quais especialistas na área, instituições de ensino superior, organizações representativas de professores, pais e encarregados de educação, de pessoas com deficiência, instituições particulares de educação especial e órgãos da administração e de gestão das escolas.
A atribuição desta missão teve por base a evidente necessidade de realizar uma análise mais abrangente e sustentada da Educação Especial e das dimensões que este setor implica e mobiliza, tendo também em consideração o contexto mais amplo das medidas de promoção do sucesso escolar oferecidas pelo sistema educativo.
Numa sessão realizada em Lisboa, na qual participaram os Secretários de Estado do Ensino Básico e Secundário, João Grancho, do Ensino e da Administração Escolar, João Casanova de Almeida, e da Solidariedade e da Segurança Social, Agostinho Branquinho, o Grupo de Trabalho propôs à tutela, entre outros aspetos:
  • A simplificação e harmonização da legislação relativa à educação especial e ao apoio às dificuldades na aprendizagem, criando condições para que nas escolas se prevejam os apoios necessários ao desenvolvimento de cada um dos alunos. Este novo quadro normativo deverá conter quer as medidas de carácter pedagógico e didático, quer as medidas de apoio especializado reservadas aos alunos com limitações significativas;
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  • Criação de estruturas multidisciplinares encarregues da avaliação, planeamento e implementação de atividades de diferenciação pedagógica e acompanhamento de professores, alunos e famílias. Estas equipas deverão beneficiar da existência de um segundo nível de missão onde as tutelas da educação, saúde e segurança social articularão a sua intervenção;
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  • A revisão do modelo de intervenção de técnicos especializados e terapeutas em contextos educativos para a capacitação dos docentes, bem como para o apoio direto aos alunos que apresentam perturbações mais complexas ou que preparam a sua transição para a vida pós-escolar, reservando as intervenções de natureza terapêutica e/ou reabilitativa para o foro do Serviço Nacional de Saúde;
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  • A qualificação dos serviços especializados prestados aos alunos com perturbações nas estruturas e funções do corpo de caráter permanente, por via da revisão da formação inicial e contínua de professores e de direções escolares;
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  • A criação de uma medida intermédia entre Programa Educativo Individual e Currículo Específico Individual, orientada para alunos que, não tendo capacidade para prosseguir estudos no ensino superior, têm, todavia, interesse e potencial para concluir o ensino secundário obtendo uma certificação parcial onde fiquem expressos os conhecimentos e capacidades adquiridas;
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  • A revisão da legislação relativa ao subsídio de educação especial e a redistribuição de competências pelos apoios de natureza habilitativa e reabilitativa aos alunos com deficiência entre os Ministérios da Saúde, da Educação e Ciência e da Solidariedade, Emprego e Segurança Social.

In :Página do Governo

Publicada por Salete Bento



quarta-feira, 4 de junho de 2014

Madicalização e patologização da educação


De repente, ou talvez aos poucos, um elevado número de crianças foram sendo catalogadas de anormais e a necessidade de tomarem algo foi-se impondo como um facto quase inquestionável.



“Nem pensar em dar medicação ao meu filho. Já trabalhei no contexto da saúde e sei bem o que isso significa.” Foi com perplexidade que ouvi as palavras desta mãe, como resposta à afirmação da professora titular de que o filho muito provavelmente seria hiperativo e talvez precisasse de tomar algo que o acalmasse. A determinação e firmeza daquela mãe fecharam completamente a hipótese de solucionar o problema daquela criança através do uso de fármacos. A aceitação relativamente pacífica, ou aparentemente pacífica, com que os pais frequentemente aderem à perspetiva de que os filhos venham a tomar medicamentos permitiu a esta mãe destacar-se pela diferença.

Para quem trabalha em contexto escolar, a invasão medicamentosa não constitui novidade. De repente, ou talvez aos poucos, um elevado número de crianças foram sendo catalogadas de anormais e a necessidade de tomarem algo foi-se impondo como um facto quase inquestionável. Questões não médicas foram-se transformando artificialmente em problemas médicos (medicalização). Os pais, de certa maneira pressionados por uma escola pouco preparada para ir respondendo à diferença, acabam por ir procurar nos médicos a solução para a agitação motora, falta de atenção, comportamentos de oposição e outros, potenciadores de insucesso e opositores à boa gestão da sala de aula. Para quem ouve os mais novos, é perfeitamente claro que querer mantê-los horas a fio fechados em cubículos apertados não facilita o processo de aprendizagem e potencia a instauração da indisciplina. Causa-me intranquilidade pensar que temos de “drunfar” as crianças para estas se adaptarem a uma escola que não está adequada a elas. Causa-me inquietação que os pais, na busca da melhor e mais rápida solução para os problemas (não tenho dúvida de que os pais querem o melhor para os filhos), vão procurar soluções químicas, que poderão traduzir-se de uma forma pouco positiva na saúde dos filhos. Perturba-me pensar que há gente a aproveitar-se e a ganhar dinheiro com a febre da solução rápida dos problemas. Causa-me preocupação que grandes questões políticas, sociais, culturais e afetivas sejam mascaradas como “doenças”, “transtornos”, “distúrbios”; que questões coletivas sejam tomadas como individuais e que problemas sociais e políticos sejam assumidos como problemas de foro biológico. Neste processo, que gera angústia e ansiedade, a pessoa e as famílias são responsabilizadas pelos problemas, enquanto governos, autoridades e profissionais são absolvidos das suas responsabilidades.

Felizmente, há já um elevado número de pessoas sensibilizadas para as questões aqui expostas. No dia 16 de maio realizou-se na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação, da Universidade do Porto, um seminário de grande interesse, cujo tema era precisamente “Por uma abordagem não medicalizante nem patologizante da educação“, em que estas e outras questões foram alvo de análise e reflexão.

Para concluir, gostaria de sublinhar que o problema aqui apresentado não é um problema individual. Os pais são frequentemente pressionados a recorrer ao apoio da saúde, os professores sentem-se impotentes pois não conseguem que os alunos atinjam as metas estipuladas e a medicação surge como a solução mágica, já que em muitas situações até resulta e bem! A minha dúvida, em muitas situações, é se o bem de hoje se traduzirá em bem futuro. Gostaria também de sublinhar que em algumas situações a medicação é mesmo necessária; o problema que se coloca é ter-se generalizado como solução para um grande número de problemas, que não serão, de todo, de foro individual.
Adriana Campos
Educare

Publicada por Salete Bento